Em um cenário de cores, batidas contagiantes e sorrisos largos, o Rio de Janeiro consolidou-se mais uma vez como o palco do maior encontro de samba e pagode do país. A terceira edição do Capital do Samba, realizada neste ano, superou expectativas e transformou a cidade em um verdadeiro coração pulsante de cultura popular. Com uma programação que misturou tradição e inovação, o festival atraiu milhares de turistas e cariocas, reafirmando o gênero musical não apenas como um símbolo histórico, mas como uma força viva e em constante renovação.
O Sambódromo como Templo da Festa
O tradicional Sambódromo da Marquês de Sapucaí, conhecido mundialmente por abrigar os desfiles das escolas de samba durante o Carnaval, ganhou nova vida durante os quatro dias de evento. Desta vez, porém, não foram carros alegóricos ou alas temáticas que dominaram a passarela, mas sim palcos estratégicos que receberam mais de 50 atrações. De lendas do samba a promessas do pagode moderno, o line-up foi desenhado para celebrar todas as gerações. Nomes como Arlindo Cruz, Ferrugem e Teresa Cristina dividiram espaço com jovens talentos revelados em comunidades, como o grupo Pagode da Vela e a cantora Letícia Sabatella, cuja voz rouca e letras urbanas conquistaram até os mais puristas.
Um dos momentos mais emocionantes foi a apresentação surpresa de Zeca Pagodinho, que subiu ao palco ao lado do produtor musical Rômulo Costa para apresentar um medley de sucessos. “Aqui é onde o samba respira sem pressa”, declarou Zeca, entre uma canção e outra, enquanto a plateia cantava em uníssono.
Além da Música: Um Mergulho na Cultura Popular
O festival não se limitou aos shows. Espaços interativos permitiram que o público vivesse o samba além das notas musicais. Na Feira da Gamboa, artesãos exibiram instrumentos artesanais, como tamborins e cavaquinhos, enquanto oficinas gratuitas ensinavam ritmos básicos a iniciantes. Uma área gastronômica destacou comidas de raiz, como feijoada preparada em fogão à lenha e bolinhos de bacalhau seguindo receitas centenárias.
Para muitos, porém, o grande destaque foi o Palco Raiz, montado no Morro da Providência, comunidade considerada o berço do samba carioca. Lá, rodas de samba improvisadas duraram até o amanhecer, com moradores e visitantes compartilhando histórias e canções. “Isso aqui é a essência do que o samba representa: resistência e alegria mesmo nas dificuldades”, comentou João da Cuíca, mestre de uma das escolas de samba mais antigas da região.
Inovação e Sustentabilidade
A edição de 2025 também introduziu novidades tecnológicas e ambientais. Pela primeira vez, parte da energia dos palcos foi gerada por pisos cinéticos, que convertem o movimento da dança do público em eletricidade. Além disso, copos retornáveis e estações de reciclagem espalhadas pelo evento reduziram em 40% o lixo produzido em comparação ao ano anterior.
Outro avanço foi a inclusão de intérpretes de libras em todos os palcos, garantindo acessibilidade. “O samba é para todos, sem exceção. Queremos que cada pessoa sinta a batida no peito, independente de como a escute”, explicou uma das organizadoras.
Impacto Econômico e Social
Com público estimado em 300 mil pessoas ao longo dos dias, o Capital do Samba injetou milhões na economia local. Hotéis na Zona Portuária e no Centro registraram ocupação total, enquanto pequenos comerciantes viram vendas aumentarem em até 70%. Para comunidades como Mangueira e Salgueiro, o festival também abriu portas: grupos locais receberam patrocínio para se apresentar, e cooperativas de costureiras foram contratadas para produzir parte do merchandising oficial.
O Futuro do Samba em Debate
Em paralelo à festa, um fórum discutiu os desafios do gênero na era digital. Artistas e produtores destacaram a necessidade de políticas públicas para preservar casas de show históricas, ameaçadas pela especulação imobiliária, e de incentivos para que jovens possam viver da música sem abandonar suas raízes. “O samba não é só passado; é presente e futuro. Precisamos ocupar espaços nas plataformas digitais sem perder a autenticidade”, defendeu a cantora Mariene de Castro.
Conclusão: Um Legado que Ecoa
Enquanto os últimos acordes do festival ecoavam no Sambódromo, era claro que o Capital do Samba transcendeu o entretenimento. Tornou-se um manifesto cultural, uma celebração de identidade e um lembrete de que, no Rio de Janeiro, o samba continua sendo a trilha sonora da vida. Como resumiu um casal de turistas argentinos ao deixar o local: “Aqui, a música não se ouve — se sente. E isso não tem preço”.
A próxima edição já é aguardada com ansiedade, mas, até lá, o espírito do festival permanece nas ruas, nas ladeiras e nos corações daqueles que sabem: o samba, mais do que um ritmo, é a alma de um povo.